quinta-feira, 4 de abril de 2013

Despesa Pública, Austeridade e Crescimento

por
José António Girão
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Como todos sabemos (e bem sentimos! ) Portugal atravessa presentemente uma situação de profunda crise económica, social e política, decorrente da situação financeira a que um conjunto de sucessivas políticas públicas dasajustadas e/ou incorrectas o conduziram, e que se traduz, em particular, num nível de endividamento insustentável, nomeadamente no que respeita à chamada “dívida soberana”. Neste contexto e por virtude do processo de ajustamento necessário à correcção deste endividamento excessivo, ganha relevo o papel a atribuir à despesa pública, por virtude da urgência em ultrapassar a dicotomia “austeridade vs. crescimento”.

Com efeito, sendo a dívida do Estado a parcela do endividamento resultante das necessidades de financiamento do sector público ao longo do tempo, e estas fundamentalmente o resultado dos défices acumulados pelo sector público, é imediato constatar o papel determinante que o nível da despesa pública terá na definição do correspondente défice (excesso desta relativamente à receita). A questão relevante que se coloca é, pois, a de saber se num determinado caso concreto de necessidade dum ajustamento da dívida pública, é possível (e em que medida) recorrer à diminuição da despesa, face ao papel desempenhado na economia pelas diferentes categorias desta (salários, aquisição de bens e serviços, juros, transferências e outros encargos sociais ).

É neste quadro que um conjunto de cidadãos empenhados e conscientes do papel que a redução da despesa pública pode (e deve) desempenhar no ajustamento estrutural do défice e da dívida pública em Portugal, decidiram subscrever um Manifesto intitulado “Despesa Pública Menor para um Futuro Melhor” e assim procurar dar um contributo para que a austeridade que estamos vivendo não seja um “acto falhado” . (http://umfuturomelhorparaportugal.blogspot.pt/). Submetem-no agora ao escrutínio e subscrição pública.

O presente Manifesto não pretende ser a resposta completa ao desafio que vem sendo lançado aos que contestam o caminho e as políticas que vêm sendo seguidas – como sendo únicas – para que apresentem alternativas. Este Manifesto constitui apenas uma resposta parcelar a esse desafio, mas num domínio considerado incontornável: o da diminuição da despesa pública, como forma de libertar os recursos indispensáveis à recuperação, revitalização e dinamização da economia, sem o que não haverá crescimento nem desenvolvimento sustentáveis.

Visa, assim, demonstrar não só que essa possibilidade existe, e é urgente prossegui-la com determinação e afinco, como igualmente pôr em evidência a sua inevitabilidade. Caso contrário ficará em causa a continuidade da nossa participação no euro e até,eventualmente, a de podermos respeitar as regras exigidas pela nossa participação na União Europeia (UE). Se já são grandes os custos do ajustamento por que estamos a passar, não é difícil imaginar a magnitude dos associados a uma tal evolução.

Quanto à inevitabilidade, ela resulta não só de ser insustentável a manutenção do actual nível da dívida pública (superior a 120% do PIB), como das regras inerentes ao novo Pacto Orçamental da UEM – ou seja, défice estrutural não superior a 0.5% do PIB e rácio da dívida pública convergindo para 60% do PIB. Face à carga fiscal que onera já os cidadãos, não se vislumbra como seria possível alcançar o desiderato aqui referido, sem ser com redução da despesa pública. Mas tal é possível, como o Manifesto sugere, recorrendo a um conjunto de medidas visando o aumento da eficiência, equidade e transparência no funcionamento da economia, como forma de assegurar a eficácia e proporcionalidade (justiça) das políticas públicas adoptadas, com vista a assegurar o bem-comum, expresso democraticamente pelos cidadãos.

Em síntese, o Manifesto sobre a redução da despesa pública põe em destaque as linhas orientadoras para uma tal redução, mas simultaneamente propiciadoras da libertação de recursos necessários a um ressurgimento da actividade económica e do crescimento; i.e., o documento situa-se, assim, ao nível dos princípios, já que as medidas concretas de política económica terão, necessariamente, de envolver uma análise aprofundada, com estimação do seu impacto (em termos de custos e benefícios), enquanto fundamentação para a tomada de decisões.

Com efeito, uma das mistificações a que urge pôr termo é a ideia de que a crise que o País actualmente atravessa pode ser resolvida com recurso a medidas pontuais. De facto, não é isso que a história nos ensina; a profundidade e complexidade dos problemas com que nos confrontamos, impõe que se pense em termos de objectivos estratégicos, visando alcançar fins claramente explicitados e assumidos, e que para tal se recorra a um conjunto de políticas públicas, criteriosamente seleccionadas, analisadas e avaliadas em termos dos seus impactos (positivos e negativos) e maioritariamente, e tanto quanto possível consensualmente assumidas, com vista à sua adopção e implememtação.


Daí que a redução da despesa pública não deva ser encarada senão como um dos objectivos estratégicos – embora cruciais - do “puzzle” com que estamos confrontados, e entre os quais deverão ser incluídos, também, a reforma do sistema político (actualmente demasiado centrada nos Partidos e muito pouco na sociedade civil e nos cidadãos), do sistema judicial (a que falta “accountability” e celeridade) e da Administração Pública (central, regional e local, a que falta profissionalismo, sentido de responsabilidade e independência, como resultado da excessiva politização e partidarização) entre outras reformas.

É verdade, e importa igualmente reconhecer que a crise que vivemos só poderá ser completa e satisfatoriamente resolvida, se igualmente forem ultrapassadas as crises mais globais acualmente existentes, nomeadamente a nível europeu e em particular de liderança. Mas tal não constitui um substituto para o muito que temos, e nos compete fazer. É sim complementar, tanto mais que os acontecimentos mais recentes na UE (v.g. Chipre) sugerem que a solidariedade, a existir ainda, implica também maior convergência de princípios, objectivos e culturas. Solidariedade passa, assim, a ser conjugado com redução da heterogeneidade.

O corolário do que precede, aponta inequivocamente no sentido de que é longo o caminho a percorrer. Portugal não vencerá a crise em que se encontra mergulhado, no momento em que se libertar da Troika, ou no dia em que mostrar capacidade para obter nos mercados o financiamento de que necessita. O período pós-Troika vai continuar a exigir grande rigor, a fim de assegurar a nossa credibilidade e empenhamento no cumprimento dos objectivos do Pacto Orçamental.

Tal desiderato deveria idealmente ser assegurado por um “Pacto de Regime”, envolvendo pelo menos as forças políticas do “arco da governação” e os parceiros sociais, por forma a garantir o cumprimento das restrições impostas pela nossa participação na UEM, independentemente da composição do Governo. Como tal deverá assentar na assumpção conjunta dos desígnios clara e explicitamente assumidos, e dos

objectivos estratégicos a prosseguir, e aos quais as políticas públicas a implementar visarão dar resposta, no âmbito do quadro partidário e do Governo que estiver em funções.

Como alcançar o desiderato que constitui a indispensável mas eficaz redução da despesa pública, conjuntamente com a imperiosidade de outras reformas, e o objectivo estratégico do crescimento é o grande desafio que se coloca aos portugueses e às suas instituições, com vista a alcançar o desenvolvimento do País em paz e harmonia, e a garantir a sua sustentabilidade e o bem-estar social. Nisto nos devemos todos empenhar!

Um comentário:

  1. Este manifesto tem erros graves ao insistir que a despesa social em Portugal é elevada.

    Isso é falso, a despesa social em saude, educação e pensões da S.social é inferior à média da UE.

    É superior á média nas pensões da CGA e no subsidios de desemprego, porque temos 18% de desemprego contra os 11% da UE !

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